Pesquisa premiada de estudantes e professores da EMEF Alberto Pasqualini com uso de metaverso pode dar origem a novo recurso de aprendizagem para autistas
Estudantes do 9º ano da Escola Municipal de Ensino Fundamental (EMEF) Alberto Pasqualini, as parceiras de pesquisa Brenda Rosa Nienov e Kauane Vitória Juvenal, 15 anos, trocaram um olhar no momento em que souberam que um projeto vitorioso na 14ª edição da Mostra Científica e Tecnológica das Escolas de Ensino Médio da Serra Gaúcha (MOSTRASEG) seria premiado com uma bolsa de 100% para cumprir os próximos três anos de estudos na Escola de Ensino Médio e Técnico da Universidade de Caxias do Sul – o CETEC UCS. Praticamente um atalho para o Ensino Superior.
“Nos olhamos e entendemos que tínhamos que ir para a UCS. Tínhamos que ir para a UCS”, determinaram as amigas.

Menos de um ano depois de estabelecerem a meta, elas já foram muito além. Brenda e Kauane brotaram nos corredores da Alberto Pasqualini, localizada no bairro Bela Vista, na última sexta-feira (3), como se Olivia Rodrigo e Miley Cyrus estivessem passando para reencontrar os ex-colegas: sob aclamação e muitos abraços. Agora matriculadas no CETEC. E atendendo pedido de entrevista para um documentário que deve ir ao ar no segundo semestre de 2023 pelo Canal Futura.
O projeto Metaverso auxiliando na aprendizagem de autistas, desenvolvido sob orientação da professora Carla Eliana Todero Ritter, vencedor da categoria Ensino Fundamental da MOSTRASEG 2022 – e que garantiu às duas amigas a sonhada bolsa 100% no Ensino Médio da UCS – será tema de um dos 13 episódios da quarta temporada da série Idade Mídia, que além de disponível na TV por assinatura, também estará no catálogo do serviço de streaming Globoplay.
Entre parte das gravações para a produtora Deusdará Filmes na biblioteca e no laboratório de informática da escola municipal, ficou claro o quanto estava acertada outra percepção da dupla, ainda do ano passado, quando ganharam a disputa científica: a vida mudou no momento em que ouviram – chorando – os próprios nomes anunciados como vencedoras. Agora, Brenda e Kauane são referências para os ex-colegas de anos inferiores, que descobriram ali um espelho para sonhar com as próprias conquistas.
O choro das atuais estudantes do CETEC, desta vez, veio ao reencontrar a professora com quem, entre tantas outras cumplicidades, compartilharam a desobediência a um conselho ouvido de quase todo mundo quando começaram o trabalho que consumiu tantas horas de angústia quanto noites de sono: “Não inventa moda”. Elas fizeram o contrário.

Estímulo em sala de aula
No que depender da diretora Gabriela Reginato, o nome da EMEF Alberto Pasqualini aparecerá cada vez mais nas listas de participantes – preferencialmente, de vencedores – de mostras científicas. O estímulo à pesquisa virou diretriz na instituição, que proporciona incentivo aos estudantes e apoio aos professores para o desenvolvimento dos trabalhos. E se repete em outras instituições mantidas pela Secretaria Municipal de Educação (SMED).
O segundo lugar na categoria Ensino Fundamental da MOSTRASEG 2022 foi para a Escola Municipal de Ensino Fundamental de Tempo Integral (EMEFTI) Governador Leonel de Moura Brizola, com o projeto Autoaceitação na adolescência: desafios e possibilidades, desenvolvido pelos estudantes Antonio Carlos Albeche de Souza Vieira, Arthur Garcia Sachete e Tifany Melissa Tressoldi, sob a orientação das professoras Ana Carolina Sbeghen Loss e Jaquelini Mara Agostini Richetti.
E a EMEF Padre João Schiavo ainda faturou o prêmio Pensando a Educação com o projeto Educação no campo: uma análise da aprendizagem dos estudantes e possíveis caminhos para amenizar esse grave problema social, de autoria do estudante Alejandro Brayan da Costa e Souza.
“Fazemos o nosso papel enquanto escola e equipe diretiva da melhor forma possível, com as condições de que dispomos. Cada vez que um estudante nosso consegue um bom resultado como este, os demais se sentem estimulados a percorrer a mesma trajetória. E independentemente do resultado, o importante é que eles se desenvolvam e adquiram conhecimento. Toda escola evolui junto”, afirma Gabriela.
Segundo Brenda Rosa Nienov e Kauane Vitória Juvenal, a empolgação e o grau de exigência da professora de matemática e ciências Carla Eliana Todero Ritter exerceu influência fundamental desde a arrancada da pesquisa. E mais ainda, nos momentos em que a tentação da desistência bateu à porta.
“Vida de pesquisador é isso. É virar a noite acordado, é criar hábito de estudar, botar na cabeça que vai chegar no fim. Costumo dizer que um bom trabalho é consequência de qualidade e condição”, ensina Carla.
Inspiradas por uma palestra sobre empreendedorismo e pela observação de dois irmãos gêmeos do 1º ano sob atendimento educacional especial, as amigas não economizaram na ousadia e decidiram investigar como a população autista seria atingida e de que forma responderia ao estímulo do metaverso. Elas jamais haviam participado de qualquer projeto científico antes.
“Num primeiro momento, nem nossas famílias tinham ideia do que estávamos fazendo. Minha mãe só falava que eu estava dormindo pouco”, revela Kauane.
“Depois que nós ganhamos o prêmio, os colegas mesmos se deram conta de que poderiam ir mais longe”, conta Brenda.
Papelão preso com borrachinha de dinheiro
Entre abril e agosto de 2022, a dupla se dedicou a investigar a hipótese de utilizar o recurso do metaverso como auxiliar na aprendizagem de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA). E em caso positivo, de que maneira. O público estudado compreendia a faixa dos 8 aos 13 anos.
“Percebemos que eles respondiam muito bem ao estímulo. Alguns mostraram ali os primeiros sinais de comunicação, coisa que nunca haviam feito até então. Foi muito promissor”, relata Carla.
Mais promissor ainda foi o saldo da passagem pela Mostra Internacional de Ciência e Tecnologia (MOSTRATEC), pouco depois, em Novo Hamburgo. Do contraste de estrutura com outros participantes à doação de dois óculos de realidade virtual por um professor do Paraná. A versão anterior, usada na exibição vencedora, pode ser descrita como… artesanal.
“Olhávamos para o lado e víamos gente com letreiro luminoso. O nosso era de EVA”, lembra Kauane.
“E os nossos óculos nós mesmas fizemos, com celular e papelão, preso com borrachinha de dinheiro”, recorda Brenda.
Nos próximos dias, as aliadas começam a desenvolver o projeto para a primeira participação na concorrida mostra científica do CETEC – onde agora cumprem o 1º do Ensino Médio. Já estão cientes de que o nível de exigência será outro. Mas têm uma receita em que sabem que podem confiar, desde o momento em que formaram a parceria:
“A união do nosso pensamento diferente com a personalidade forte”, falam, rindo.
Fotos: Samuel Maciel e Gabriel Izidoro