Religiosa de Farroupilha premiada pela ONU pelo trabalho com refugiados ressaltou o emprego como principal via de integração de migrantes e refugiados
Um médico que passou quatro anos trabalhando como faxineiro até conseguir revalidar o diploma no Brasil foi um dos exemplos usados por Irmã Rosita Milesi para ilustrar a realidade de quem chega ao país em busca de recomeço. “Eles não recusam trabalho. Aceitam aonde há oportunidade, porque precisam sustentar a família”, relatou durante a Reunião-Almoço da CIC desta segunda-feira (29).
Natural de Farroupilha, a religiosa scalabriniana dirige o Instituto Migrações e Direitos Humanos (IMDH) e atua há décadas na defesa de migrantes e refugiados. Em 2024, recebeu o Prêmio Global Nansen, a mais importante distinção do ACNUR/ONU, tornando-se a segunda brasileira a ser reconhecida — antes dela, apenas Dom Paulo Evaristo Arns, arcebispo de São Paulo, havia conquistado o título, em 1985.
Para Irmã Rosita, o emprego é a política de integração mais eficaz. A experiência da Casa Bom Samaritano, em Caxias do Sul, confirma essa percepção: entre 2021 e 2025, foram 314 famílias acolhidas, todas saindo do centro com ao menos uma pessoa empregada. “Trabalhar, sustentar a família e contribuir com a comunidade local é tudo o que essas pessoas querem”, afirmou.
Levantamento do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) e do Observatório das Migrações da Universidade de Brasília (OBMigra) reforça essa realidade. Em 2025, Caxias do Sul registrou 5.705 admissões de migrantes e refugiados, com saldo positivo de 1.008 vagas.
Em coletiva de imprensa após a palestra, Rosita também respondeu a quem acredita que migrantes “roubam empregos” de brasileiros. “Esse é um entendimento errôneo. Normalmente eles iniciam em atividades muito básicas, que muitas vezes não atraem trabalhadores locais. As vagas abertas estão para todos: brasileiros, imigrantes e refugiados. Quem se apresenta, tem a oportunidade”, destacou.
A religiosa reforçou que não defende privilégios, mas sensibilidade diante das dificuldades específicas de quem chega ao país sem idioma, sem rede de apoio e sem documentação. “É preciso ter a humanidade de enxergar que essas pessoas começam do zero. Oferecer aulas de português, apoiar na documentação e criar oportunidades de trabalho é colocar o humanismo em prática”, afirmou.
Rosita também alertou para a ligação crescente entre mudanças climáticas e deslocamentos forçados. “Se não implementarmos medidas urgentes para recuperar a natureza, caminhamos para um futuro de autodestruição. O desenvolvimento precisa ser equilibrado, ou acabaremos perdendo tudo”, disse, lembrando a expectativa de compromissos mais firmes na COP30 que vai ocorrer em novembro em Belém (PA).
Ao comentar o papel da ONU, destacou que a organização depende do apoio dos países-membros para avançar em políticas humanitárias. Para ela, o momento atual exige responsabilidade coletiva. “As crises não são o fim, mas a oportunidade de pensar novas soluções. Migrantes e refugiados querem apenas viver com dignidade. Criar pontes, e não muros, é o desafio que está diante de nós”, concluiu.